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segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Privatização da Petrobras não pode ser tratada como assunto 'religioso', diz Gustavo Franco

Leia também: LITURGIA DA PALAVRA

O economista Gustavo Franco

Image captionPartido Novo defende ideias liberais "sem nenhum disfarce", diz Franco | Crédito: Divulgação

Em julho, poucos dias antes da votação da denúncia contra Michel Temer (PMDB) no plenário da Câmara, o economista Gustavo Franco, filiado ao PSDB desde 1989, escreveu uma carta ao senador Tasso Jereissati pedindo que os tucanos desembarcassem do governo.
"Infelizmente, incapaz até agora de se dissociar de um governo manchado pela corrupção institucionalizada que herdou do PT, o PSDB tem optado por deixar vazio o centro político ético de que o país tanto precisa", diz o texto.
Dois meses depois do episódio, Franco, um dos formuladores do Plano Real, anunciou sua desfiliação do partido. Em mais uma carta, ele afirmou que a decisão estava praticamente tomada desde junho. E comparou a demora para cortar os laços de 28 anos com os tucanos à "hesitação" que teria tomado conta do partido, o qual critica pela resistência em abraçar ideias pró-mercado.

Na sequência, Franco filiou-se ao Partido Novo, que defende "sem nenhum disfarce" as ideias liberais, disse o ex-presidente do Banco Central à BBC Brasil. Com cinco vereadores eleitos, a legenda - fundada em 2011 por João Amoêdo, que já foi sócio do banco BBA e vice-presidente do Unibanco - debate com "absoluto desassombro" temas como a privatização da Petrobras e reformas trabalhistas mais "revolucionárias", que abram possibilidade de negociação de diretos como férias e 13º.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista concedida no escritório em São Paulo da Rio Bravo, gestora da qual é cofundador.
BBC Brasil - Como foi sua aproximação com o Novo?
Franco - Eu conheço o João (Amoêdo) há muitos anos e acompanho o desenvolvimento do projeto com interesse. Confesso que com ceticismo no início, mas é impressionante como as circunstâncias do Brasil tornaram o que parecia uma ideia muito atrevida em uma inovação extraordinária.
Se você perguntar às pessoas hoje qual a instituição mais desacreditada do Brasil, elas dirão: os partidos políticos. Todavia, isso não vale para o Novo, que acabou de ser criado, está totalmente livre diante desse pandemônio justamente querendo trazer um conceito novo de política, que é tudo o que as pessoas querem.
BBC Brasil - Você sempre pregou uma agenda de redução do tamanho do Estado, que é justamente o que o Novo defende.
Franco - Eu e outros economistas, muitos abrigados no PSDB, outros em outras legendas, mas isso já é uma pauta que, desde o Plano Real, se tornou meio que dominante. Sem que se falasse exatamente sobre esse predomínio, as ideias de responsabilidade fiscal, liberdade de mercado, abertura, são ideias que venceram, e o esperneio em torno delas foi o que causou o retrocesso patrocinado por Dilma Rousseff.
Estamos voltando ao leito principal e, curiosamente, pela mão de Michel Temer e pelo PMDB, que não tem nenhuma afinidade histórica com essas ideias. Porém o fato de o próprio PMDB adotar esse tipo de retórica e de ação apenas revela que são ideias amadurecidas, que apenas precisam de uma expressão mais desenvolvida, que eu creio que vai acontecer em 2018.
BBC Brasil - Se são ideias que vêm desde o Plano Real sendo amadurecidas, por que os partidos tradicionais não conseguem colocá-las em prática?
Franco - Acho que tem um fenômeno aí. Essas ideias sempre foram minoritárias no mundo político, que acho que está há muitos anos aferrado a clichês sobre o que é popular. Estas ideias envelheceram, e talvez os personagens do mundo político-partidário não tenham atinado.
Tanto que agora está havendo uma epidemia de mudanças de nome, de ideias fora da caixa. E o Novo meio que se antecipou a essa mudança, acho que é primeiro partido que traz essas ideias muito explicitamente no seu programa, sem nenhum disfarce.
BBC Brasil - Como o senhor vê a ascensão das mesmas ideias liberais que o Novo defende por meio de movimentos ligados à chamada "nova direita", que muitas vezes defendem, fora do campo da economia, ideias conservadoras? Caso recente emblemático nesse sentido foi o do MBL e a exposição do Queermuseu em Porto Alegre, que foi fechada depois de protestos de integrantes do grupo.
Franco - As ideias liberais na economia estão em toda parte, e há liberais na economia que são conservadores nos costumes. São coisas diferentes. No exterior, o termo liberal é usado em oposição ao conservador. O Novo não tem relação com essas pautas ultraconservadoras desses debates recentes.
BBC Brasil - O que deve estar no programa de governo?
Franco - O processo exato (de formulação do programa) não sei bem ainda qual será, mas acho que o aspecto divertido e produtivo desse debate entre nós vai ser o absoluto desassombro em pensar fora da caixa e poder pensar as coisas que normalmente os políticos têm medo de falar.
Têm medo de falar de privatizar a Petrobras, têm medo de falar de reformas da Previdência mais ambiciosas, reformas trabalhistas mais revolucionárias. A gente não tem problema nenhum em discutir coisas um pouco mais ousadas.

Tanques da Petrobras em BrasíliaDireito de imagemREUTERS
Image captionTemas como a privatização da Petrobras não devem ser tratados como assuntos "religiosos", diz o economista

BBC Brasil - Muita gente acha que assuntos como reforma trabalhista e privatizações são temas impopulares...
Franco - Essa ideia do que é popular termina constrangendo os debates. Vou dar um exemplo: quando se fala de reforma trabalhista. Agora, por exemplo, deixamos de fora os direitos constitucionais - 13º, férias. Aqui acho que tem um equívoco.
Os direitos fundamentais compreendem, por exemplo, o direito à vida. Você não tem o direito de tirar sua própria vida. Mas não é a mesma coisa com o 13º. Você não tem o direito de renunciar ao 13º - e deveria. Por que você não tem o direito de negociar, se abster de tirar férias, de vender suas férias?
BBC Brasil - Nesse caso, como ficaria a questão do desequilíbrio de forças entre trabalhador e empregador? A discussão que se colocou durante a tramitação da reforma trabalhista foi a de que a possibilidade de livre negociação desses direitos poderia ser prejudicial para trabalhadores.
Franco - Acho que se criou um mito da hipossuficiência do trabalhador e do consumidor, todos seriam incapazes e precisariam da proteção do Estado contra eles mesmos. A reforma de agora já introduziu o conceito pelo qual o trabalhador que ganha mais que determinado valor é livre para negociar o que bem quiser. A partir daqui é só diminuir esse nível mínimo de remuneração que define o brasileiro que não é incapaz.
BBC Brasil - Você já falou sobre privatização da Petrobras, comentou recentemente que o Banco do Brasil também estaria pronto para ser privatizado.
Franco - São assuntos patrimoniais, do Estado, o que é preciso olhar fazendo conta, e não como se fossem temas religiosos. Longe disso. Nós temos um problema, por exemplo, no sistema bancário, de excesso de concentração.
As duas organizações estatais - o Banco do Brasil e a Caixa -, juntas, têm quase metade do movimento bancário do Brasil e são instituições de eficiência muito inferior às duas outras instituições privadas grandes.

Fachada do BNDES, no Rio de JaneiroDireito de imagemREUTERS
Image captionPara Franco, a existência de um banco de fomento como o BNDES faz sentido, ainda que sua forma de financiamento possa ser revista

Criar um eixo de competição ali pra criar tensão competitiva para o benefício do consumidor no sistema bancário seria maravilhoso. Por que não? Por que o governo federal tem que ter dois bancos comerciais fazendo exatamente a mesma coisa geralmente com uma agência do lado da outra? Qual o sentido? Vamos discutir abertamente, sem preconceito.
O fato é que o Estado brasileiro tem muita dívida e tem ativos. A dívida é mais cara do que os ativos rendem. Na ponta do lápis, isso é uma justificativa para vender ativos e liquidar dívidas.
BBC Brasil - Dentro do Estado mínimo defendido pelo Novo cabem os programas de transferência de renda, como o Bolsa Família, o SUS e a educação pública?
Franco - Sim, embora em formatos diferentes. Parece óbvio que o Bolsa Família precisa ter porta de saída, que o SUS precisa de reforma e que o governo gasta mal em educação. E não se trata de defender o Estado mínimo, mas de abandonar o conceito de estado desnecessário e excessivo.
BBC Brasil - Dentro dessa linha de pensamento, faz sentido existir uma instituição como o BNDES?
Franco - Acho que sim. Há a questão dos impostos que a sociedade paga - o Pis e a Cofins - e cujos recursos vão para o BNDES. Aí é complicado. Todas as empresas pagam um imposto que vai para o BNDES, que, por sua vez, empresta para algumas empresas. Isso não é uma proposição, do ponto de vista distributivo, muito legal. Talvez a gente deva repensar o funding do BNDES e ele continuasse a existir.
Repensar seu funcionamento seria sensato, assim como seria sensato repensar o funcionamento de instituições como o FGTS ou o FAT. Ambos são parte disso que a gente conhece como poupança forçada.
O FGTS é uma poupança que rende muito pouco. O dinheiro é utilizado não por mim ou por você, mas pelo governo, para fazer políticas públicas. Ele usa nosso dinheiro, devolve um pedacinho e utiliza conforme suas prioridades. É um caso estranho de um fundo em que o seu dinheiro é usado conforme a conveniência do administrador.

O economista Gustavo Franco
Image captionPSDB é favorito em 2018, mas demais partidos serão importantes para "estabelecer a agenda", diz Franco | Crédito: Divulgação

O FAT é parecido. As duas coisas poderiam ser juntas e transformadas em uma espécie de fundo de pensão, que investiria os recursos com retornos que deixariam as pessoas mais satisfeitas, que vertessem para a aposentadoria das pessoas.
Como se estivéssemos criando aí uma espécie de reforma da Previdência 2.0, esta, no entanto, no regime de capitalização, como é no Chile e deu muito certo. Tá meio formado já, porque essas duas instituições seriam uma base superlegal para fazer essa construção.
BBC Brasil - O candidato de vocês em 2018 será João Amoêdo ou isso ainda é assunto em aberto?
Franco - É muito cedo para dizer. Acho que ele está pronto para a missão, se for da conveniência do partido que seja ele. Acho que todos têm a noção de que a missão mais importante é a ideia. É fazer o partido subir vários degraus na sua existência.
BBC Brasil - A aprovação da cláusula de barreira criou uma urgência maior para vocês para a próxima eleição? Em relação ao fundo partidário, a legenda já era contrária, certo?
Franco - O Novo é contra a existência do fundo partidário e não usa. O Brasil é um país tão complicado que até para não usar esse dinheiro é difícil. Ele está lá guardado, rendendo juros, para quando for possível devolver, devolver.
A cláusula de barreira, em geral, tem a ver com o fundo partidário, que para muitos partidos é a principal razão de existência. Mas a ideia de cumprir os requisitos mínimos para que o partido se constitua não nos assusta. A gente acha que tem uma proposta forte o suficiente para aguentar restrições que possam vir por aí.
BBC Brasil - Acredita que Henrique Meirelles seria um bom candidato a presidente?
Franco - Seria muito melhor que a média.
BBC Brasil - O que acha das propostas da gestão Doria em São Paulo?
Franco - Tive uma impressão favorável dos primeiros movimentos do prefeito Doria, mas é apenas uma impressão, como carioca estou acompanhando à distância, preocupado com o prefeito da minha cidade.
BBC Brasil - Como você vê o desafio do PSDB? Ele sofreu desgaste por não ter desembarcado do governo?
Franco - Acho que o partido sofreu um desgaste, sim, pela associação com o governo. Mas, por outro lado, tem uma base regional sólida. Tem 800 prefeitos. Tem o governador de São Paulo, o prefeito, ambos com administrações aprovadas. Todos os indicadores convencionais de uma boa possibilidade eleitoral na eleição presidencial.
Acho que até isso faz o PSDB favorito na eleição, já que não se tem o líder nas pesquisas, que é o Lula - e também o significado das pesquisas nessa altura é muito pequeno. Não tem nada parecido com a estrutura partidária do PSDB. A do PMDB a gente sabe que é regional e heterogênea, e não tem um candidato do PMDB. Então o nome do PSDB é o favorito, no meu modo de ver.
Mas os outros contendores vão ser muito importantes para estabelecer a agenda, a discussão, e o PSDB vai ter que se apresentar de um jeito que responda às críticas que as pessoas tenham - a associação com o governo ou o que fez com as suas lideranças que erraram. Isso é um problema que o partido tem que resolver, que é do dia a dia da política, e eles vão saber lidar com isso (pausa). Eu creio. Talvez (risos).
BBC Brasil - O que acha da atual equipe econômica e das comparações entre ela e o time do qual você fez parte em 93, convocada para enfrentar problemas como o da hiperinflação?
Franco - É diferente. Não sei se essa equipe se parece mais com a equipe da qual eu fiz parte... Talvez, pela limitação de trabalho que eles têm, pareça mais com a equipe do ministro Marcílio (Marques Moreira, à frente da Fazenda entre 1991 e 1992, na gestão Collor), que, quando foi ministro da Fazenda, também tinha uma equipe muito boa, mas limitada, do ponto de vista de que ele não controlava todas as atividades, todos os postos importantes da área econômica. Estava mais ou menos isolado, com termos de referência limitados no meio de uma crise política.
É verdade que esta equipe, que tem o quadro da melhor qualidade, enfrenta muitas limitações no que dá pra fazer. Está fazendo bastante coisa, mas não é suficiente diante dos desafios que a gente tem.

Fonte http://www.bbc.com/portuguese/brasil-41518992

domingo, 22 de outubro de 2017

Computação quântica: como será a internet super-rápida do futuro

Leia também: LITURGIA DA PALAVRA

Ilustração sobre internet
Image captionCentistas estão desenvolvendo uma internet quântica super-rápida parcialmente baseada em sinais de luz | Foto: Getty
Imagine computadores super-rápidos que podem resolver problemas em muito menos tempo que as máquinas de hoje. Esses "computadores quânticos" estão sendo desenvolvidos em laboratórios ao redor do mundo. Mas cientistas já se antecipam e começam a pensar em uma internet quântica baseada em sinais de luz a ultrarrápida.
Não é simples criar uma tecnologia para um aparelho que ainda não foi tecnicamente inventado, mas comunicações quânticas são um campo atrativo, porque a tecnologia permitirá o envio de mensagens que são muito mais seguras.
Mas, antes disso, há diversos problemas que precisam ser resolvidos para que a internet quântica funcione:
* Fazer computadores quânticos se comunicarem entre si;
* Garantir a proteção contra hackers;
* Transmitir mensagens por longas distâncias sem perder parte delas;
* Direcionar mensagens por uma rede quântica.

Mas o que é um computador quântico?

É uma máquina capaz de solucionar problemas computacionais muito difíceis de forma incrivelmente ágil.
Em computadores convencionais, a unidade de informação de "bit" e pode ter um valor 1 ou 0. Seu equivalente no sistema quântico – o qubit (bit quântico) – pode ser 1 e 0 ao mesmo tempo. O fenômeno permite que múltiplos cálculos sejam realizados simultaneamente.
No entanto, qubits precisam ser sincronizados usando um efeito quântico conhecido como entrelaçamento, o que Albert Einstein chamou de uma "ação fantasma à distância".
Há quatro tipos de computadores quânticos sendo desenvolvidos, que usam:
* Partículas de luz;
* Íons presos;
* Qubits supercondutores;
* Centros de vacância de nitrogênio observados em diamantes imperfeitos.
Computadores quânticos permitirão uma série de aplicações úteis, como modelar variações de reações químicas para descobrir novos medicamentos, desenvolver tecnologias de imagem para a indústria de saúde a fim de detectar problemas no corpo ou acelerar a forma como são desenvolvidas baterias, novos materiais e eletrônicos flexíveis.

Poder de processamento

Computadores quânticos podem ser mais poderosos que computadores clássicos, mas algumas aplicações exigirão ainda mais poder de processamento do que um computador quântico oferece por si só.
Se for possível fazer com que essas máquinas se comuniquem entre si, elas poderão ser conectadas para formar um enorme computador. Mas, como há quatro tipos de computadores quânticos sendo criados hoje, eles não conseguirão se comunicar sem alguma ajuda.
Alguns cientistas defendem que a internet quântica seja baseada inteiramente em partículas de luz (fótons), enquanto outros acreditam que seria mais fácil criar redes quânticas em que a luz interagisse com a matéria.
"Luz é melhor para comunicação, mas qubits de matéria são melhores para processamento", diz Joseph Fitzsimons, pesquisador do Centro de Tecnologias Quânticas da Universidade Nacional de Cingapura, à BBC. "Você precisa de ambos para fazer a rede trabalhar para estabelecer a correção de sinal, mas é difícil fazê-los interagir."
É muito caro e difícil armazenar toda informação em fótons, diz Fitzsimons, porque essas partículas não conseguem ver umas as outras e passam reto entre si, em vez de se chocarem. O especialista acredita que seria mais fácil usar a luz para comunicação e armazenar informação usando elétrons e átomos (na forma de matéria).
Símbolo de cadeado em placa de circuitos
Image captionA criptografia quântica tornará as comunicações muito mais seguras | Foto: Getty

Criptografia quântica

Uma aplicação crucial da internet quântica será a distribuição de chaves quânticas, em que uma chave secreta é gerada usando um par de fótons entrelaçados e usada para criptografar informação de uma forma que é impossível para um computador quântico quebrá-la.
Essa tecnologia já existe, e foi primeiro demonstrada no espaço por uma equipe de pesquisadores da Universidade Nacional de Cingapura e da Universidade de Strathclyde, no Reino Unido, em dezembro de 2015.
Mas não é apenas dessa criptografia que precisaremos no futuro para garantir a segurança de nossa informação. Cientistas também estão trabalhando em "protocolos cegos de computador quântico", que permitem ocultar qualquer coisa em um computador.
"Você pode escrever algo, enviar para um computador remoto e a dona da máquina não conseguirá saber nada a respeito, a não ser a duração do processamento (do arquivo) e a quantidade de memória que usou", diz Fitzsimons.
"Isso é importante porque provavelmente não haverá muitos computadores quânticos quando eles surgirem, então, as pessoas vão querer rodar programas neles, como fazemos hoje com a nuvem."
Há duas abordagens possíveis para fazer uma rede quântica – com comunicações em terra ou pelo espaço. Ambos os métodos funcionam para enviar bits comuns de dados pela internet atual, mas, se quisermos enviar dados como qubits no futuro, será muito mais complicado.
Para enviar partículas de luz (fótons), podemos usar cabos de fibra óptica em terra. No entanto, os sinais de luz se deterioram ao longo de grandes distâncias, porque os cabos às vezes absorvem a luz.
É possível evitar isso ao construir "estações de repetição" a cada 50 km. Elas seriam basicamente laboratórios quânticos em miniatura que tentariam reparar o sinal antes de enviá-lo adiante para o próximo nódulo da rede. Mas esse sistema tem suas próprias complexidades.
Sinal de luz é enviado a satélite
Image captionA proposta é que estações na Terra sejam capazes de enviar informações por sinais de luz para satélites | Imagem: Johannes Handsteiner / ÖAW

Terra ou espaço?

E há as redes espaciais. Digamos que você queira enviar uma mensagem do Reino Unido para a Austrália. O sinal de luz é enviado de uma estação em solo britânico para um satélite com uma fonte de luz instalada nele.
O satélite envia o sinal de luz para outro satélite, que então envia o sinal para uma estação em solo australiano, e a mensagem pode ser transmitida por meio de uma rede quântica em terra ou por uma rede tradicional de internet para o destinatário.
"Como não há ar entre os satélites, não há nada para degradar o sinal", diz Jamie Vicary, pesquisador do departamento de Ciência da Computação da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e membro do Hub de Tecnologias de Informação Quânticas em Rede (NQIT, na sigla em inglês).
"Se você de fato quiser ter uma internet quântica em escala global, soluções com base no espaço parecem ser a única forma de fazê-la funcionar, mas é a mais cara."
O teletransporte quântico pelo espaço já foi realizado com sucesso, e cientistas estão tentando provar que é possível fazer isso através de distâncias cada vez maiores.
Membros da Academia de Ciências Chinesa foram parar nas manchetes em junho quando conseguiram teletransportar fótons entrelaçados entre duas cidades na China localizadas a 1,2 mil km de distância entre si. Eles usaram um satélite quântico especial chamado Micius.
Os mesmos cientistas chineses superaram recentemente o próprio recorde ao, em 29 de setembro, realizar a primeira ligação intercontinental por vídeo protegida por uma chave quântica, com pesquisadores da Áustria, a uma distância de 7,7 mil km.
A ligação durou 20 minutos, e os participantes foram capazes de trocar fotos criptografadas do satélite Micus e do físico austríaco Erwin Schrödinger.
Rupert Ursin, membro do Instituto de Óptica e Informação Quânticas da Academia de Ciências Austríaca, acredita que a internet quântica demandará redes em terra e pelo espaço operando em paralelo. "Nas cidades, precisamos de redes de fibra, mas as conexões a grandes distâncias terá de ser realizada com comunicações por satélite."
Cientistas chineses e austríacos se comunicam por vídeo
Image captionPesquisadores da China e da Áustria fizeram uma ligação por vídeo inédita | Foto: ÖAW

Como funciona uma chave de distribuição quântica?

Para entender como funciona uma chave quântica, precisamos voltar à chamada de vídeo entre cientistas chineses e austríacos. O satélite Micius usou sua fonte de luz para estabelecer conexões ópticas com as estações em terra na Áustria e na China. Foi então capaz de gerar uma chave quântica.
O mais interessante da criptografia quântica é que você pode detectar quanto alguém tentou interceptar a mensagem antes de ela chegar ao destinatário ou quantas pessoas tentaram acessá-la.
O Micius foi capaz de dizer que a criptografia não havia sido violada e que ninguém estava ouvindo à ligação. Deu então o 'ok' para criptografar os dados usando a chave secreta e transmiti-los por uma rede pública de internet.

Mensagens

Diversos grupos de cientistas estão desenvolvendo redes em terra ao trabalhar em tecnologias de estações de repetição quânticas, localizadas a cada 50 km, conectadas por cabos de fibra óptica.
Essas estações, conhecidas como "nódulos de rede quânticos", precisarão realizar diversas ações para direcionar as mensagens pela rede.
Primeiro, cada nódulo precisa reparar o sinal e potencializar o sinal que ficou prejudicado ao percorrer os 50 km anteriores da rede.
Imagine que você esteja usando uma máquina de fax para enviar um documento de uma página para outra pessoa e, cada vez que você manda a página, uma parte diferente da mensagem fica faltando, e o destinatário precisa juntar as partes da mensagem obtidas em cada tentativa.
Isso é similar a como uma única mensagem pode ser enviada entre diferentes nódulos em uma rede quântica.
Cabo de fibra óptica
Image captionA fibra óptica será empregada na construção de redes quânticas | Foto: Getty
Haverá muitas pessoas na rede, todas tentando falar umas com as outras. Então, o nódulo, ou a estação repetidora, terá de descobrir como distribuir o poder de processamento disponível para montar todas as mensagens sendo enviadas. Também terá de enviar mensagens entre a internet quântica e a internet clássica.
A Universidade de Delft está construindo uma rede quântica usando vacâncias de nitrogênio em diamantes, e isso demonstrou até agora ser capaz de armazenar e distribuir as conexões necessárias para comunicações quânticas a grandes distâncias.
A Universidade de Oxford e a Universidade de Maryland (EUA) estão construindo computadores quânticos que funcionam de forma similar a uma rede. Consistem em nódulos de íons presos que foram conectados em rede para se comunicarem.
Quanto maior for o computador desejado, mais nódulos serão necessários adicionar, mas esse tipo de computador quântico apenas transmite dados a curta distância.
"Queremos fazer com que sejam pequenos para que sejam bem protegidos da degradação do sinal, mas, se forem pequenos, eles não conseguirão armazenar muitos qubits", diz Vicary.
"Se conectarmos nódulos em rede, então, ainda podemos ter um computador quântico sem precisar limitar o número de qubits e ainda assim proteger os nódulos."

Memória quântica

A estação repetidora também precisará um chip de memória quântico. Os nódulos criam "conexões", que consistem em pares de partículas de luz entrelaçadas. Esses pares são preparados com antecedência.
Enquanto o nódulo calcula a rota pela rede que a mensagem terá de percorrer, ele terá de armazenar o par de fótons entrelaçados em algum local seguro, então, a memória quântica é necessária. Ela terá de armazenar os fótons pelo tempo que for necessário.
Rose Ahlefeldt e Matthew Sellars operam laser
Image captionCientistas estão usando laser para analizar cristais raros na ANU | Foto: Stuart Hay, ANU
Pesquisadores da Universidade Nacional Australiana (ANU, na sigla em inglês) desenvolveram um chip de memória quântica compatível com telecomunicações usando um tipo específico de cristal. Esse invento é capaz de armazenar luz na cor correta e de fazer isso por mais de um segundo, o que é 10 mil vezes mais do que todas tentativas realizadas até agora.
"O principal desafio é demonstrar uma memória quântica com uma capacidade de armazenamento grande", diz Matthew Sellars, da ANU. "Será a capacidade de armazenamento que limitará a transmissão de dados pela rede. Acredito que levará cinco anos antes que a tecnologia (para a internet quântica) seja algo usada na prática."
Fonte http://www.bbc.com/portuguese/geral-41697094

sábado, 21 de outubro de 2017

Cientistas identificam quantas mutações geram cada tipo de câncer

Leia também: LITURGIA DA PALAVRA

CâncerDireito de imagemSPL
Image captionCientistas descobriram quantas mutações são responsáveis por transformar células saudáveis am canceroras
Cientistas britânicos decifraram quantas mutações são necessárias para transformar uma célula saudável em cancerosa: entre uma e dez, dependendo do tipo de tumor.
As descobertas foram feitas por pesquisadores do Welcome Trust Sanger Institute e publicadas na revista científica Cell.
O assunto foi, por décadas, alvo de debates calorosos entre cientistas que trabalham com pesquisas sobre o câncer.
Segundo os pesquisadores, as descobertas podem aprimorar o tratamento contra a doença.
Quando se compara uma célula saudável com uma cancerosa, é possível encontrar dezenas de milhares de diferenças ─ ou mutações ─ no DNA.
Algumas dessas mutações fazem o câncer desenvolver, enquanto outras não têm qualquer impacto em seu desenvolvimento. Então quais delas são importantes?

Raiz do problema

Os pesquisadores analisaram o DNA de 7.664 tumores, para encontrar as mutações perigosas, que transformam células saudáveis em cancerosas.
Eles descobriram que:
-Uma única mutação é capaz de gerar câncer de tireoide e de testículo
-Quatro mutações provocam câncer de mama e fígado.
-Dez mutações geram câncer colorretal
Câncer no púlmãoDireito de imagemSCIENCE PHOTO LIBRARY
Image captionPesquisadores acreditam que descoberta sobre mutações ajudará em tratamentos contra câncer
"Nós tínhamos, há décadas, conhecimento sobre as bases genéticas do câncer, mas a discussão sobre quantas mutações são responsáveis pela transformação em célula cancerosa era controversa", diz Peter Campbell, um dos pesquisadores envolvidos no estudo.
"O que conseguimos nesta pesquisa foi fornecer os primeiros dados objetivos. Das milhares de mutações no genoma do câncer, só uma pequena porção é responsável por ditar o comportamento da célula, o que a torna cancerosa", explica.
Metade das mutações identificadas ocorreu em conjuntos de genes que nunca haviam sido associados ao câncer antes.

Tratamentos

O objetivo a longo prazo é promover tratamentos mais precisos contra o câncer.
Se souberem quais mutações, dentre milhares, estão fazendo o tumor avançar, os médicos poderão determinar os medicamentos mais eficazes para combater especificamente determinada mutação.
Drogas como o herceptin e os inibidores BRAF já são usadas para atacar mutações em tumores.
A identificação das mutações capazes de transformar uma célula em cancerosa foi possível graças ao uso da teoria evolucionista de Charles Darwin.
Em essência, essas mutações deveriam aparecer com mais frequência nos tumores do que em mutações "neutras" ─ aquelas que não transformam células saudáveis em cancerosas.
câncer de mama- célulaDireito de imagemSCIENCE PHOTO LIBRARY
Image captionNo caso de câncer de mama, quatro mutações são suficientes para afetar célula saudável
Segundo os cientistas, isso ocorre porque as forças da seleção natural garantem uma vantagem evolutiva às mutações que ajudam as células a crescerem e se dividirem mais rapidamente.
No entanto, Nicholas McGranahan, do Instituto de Pesquisa do Câncer do Reino Unido e do Instituto do Câncer da Universidade College London (UCL), faz ressalvas ao alcance da descoberta.
"O câncer é uma doença que se desenvolve e muda o tempo todo. Faz sentido usar essas ideias de evolução das espécies para analisar falhas genéticas que permitem o crescimento do tumor, mas esse estudo foca em uma parte da evolução do câncer", pondera.
"Ele só ajuda a resolver parte do quebra-cabeça", completa.
Segundo ele, outros componentes do DNA acondicionados nos cromossomos também são peças-chave na identificação das causas de surgimento do câncer e precisam ser analisados para permitir uma resposta clara sobre a evolução da doença.

Fonte http://www.bbc.com/portuguese/geral-41693146