Bridget Kendall
Analista diplomática da BBC News
Atualizado em 21 de dezembro, 2013 - 11:09 (Brasília) 13:09 GMT
Foi uma reviravolta extraordinária. Até dois anos atrás, o presidente russo Vladimir Putin descartava qualquer hitótese de libertar seu arquirrival Mikhail Khodorkovsky, ressaltando que "lugar de ladrão é na cadeia" e chegando a insinuar que ele teria "sangue nas mãos".
Agora o líder russo decidiu que "dez anos são suficientes" e libertou Khodorkovsky na sexta-feira por razões humanitárias. Na quinta-feira, ele havia pedido clemência às autoridades russas por causa do estado de saúde de sua mãe.
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Pouco após ser libertado, Khodorkovsky foi para Berlim, na Alemanha, onde se reuniu com o filho Pavel.
Mas o que isso significa em termos de mudança de política no Kremlin?
Ao ser solto, Khodorkovsky admitiu ter pedido clemência, mas ressaltou que isso não significa que estaria admitindo culpa e aceitando que sua sentença tenha sido justificada.
Estas declarações também representam uma mudança.
Até recentemente ouvia-se relatos de que o ex-oligarca estaria se recusando em aceitar o exílio em troca pela liberdade ou ainda pedir perdão. Ele alegava que isto implicaria em reconhecer a condenação da Justiça.
Mas a mudança de sua postura é completamente compreensível. Há rumores de que Khodorkovsky pudesse ser julgado pela terceira vez.
Isto poderia acarretar em mais uma década na prisão em alguma remota e fria colônia penal. Além do mais, ele deve ter sentido que seu tempo no cárcere tenha servido um propósito.
O que ainda não se sabe é se ele foi forçado a aceitar condições para ser libertado – como partir para o exílio e nunca mais voltar à Rússia, por exemplo?
Exílio ou silêncio
Em outras palavras, o fato é que a digna resistência de Khodorkovsky ao longo dos últimos dez anos o transformou de oligarca poderoso em dissidente de respeito.
Mas se Putin pretende repetir com ele o destino do ex-preso político e dissidente Alexander Solzhenitsyn, talvez esteja equivocado.
Em 1974, o ganhador do Prêmio Nobel foi preso e deportado da Rússia, tendo passado anos em reclusão nos Estados Unidos.
O então chefe da KGB Yury Andropov calculou, de forma correta, que a melhor maneira de livrar as autoridades soviéticas de um de seus maiores críticos era forçá-lo a sair do país para parar de chamar a atenção.
Mas é difiícil que isso se repita no caso de Khodorkovsky.
Diferententemente de Solzhenitysn, Mikhail Khodorkovsky fala inglês fluentemente e na era da comunicação digital global, sua voz e comentários podem reverberar na Rússia em questão de segundos - a menos que ele tenha concordado em não se tornar uma pedra no sapato de Putin novamente, limitando seus interesses a atividades apolíticas.
Mas tudo isso por enquanto é especulação.
Decisão tática
Talvez a motivação mais imediata de Putin para libertar seu maior inimigo seja mais tática, tendo como pano de fundo a Olimpíada de Inverno, ano que vem, na Rússia.
Outros prisioneiros cujas detenções haviam repercutido internacionalmente – como a dos ativistas do Greenpeace e a das duas cantoras da banda de rock Pussy Riot - receberam anistia recentemente.
Sua libertação, somada a de Mikhail Khodorkovsky, podem minar as chances de que um grande protesto organizado por ativistas do direitos humanos ofusque o espetáculo dos jogos, um evento que tem sido usado por Putin para promoção pessoal.
Além disso, ter Mikhail Khodorkovsky fora das grades diminui a reputação de quem, até agora, vem sendo símbolo da natureza equivocada do Judiciário russo.
A notícia de seu perdão animou os mercados em Moscou. E Putin está consciente de que a Rússia precisa desesperadamente de mais investimentos estrangeiros para dar fôlego às suas obras de infraestrutura e diversificar sua economia, fortemente ancorada no setor energético.
E talvez, num plano mais abrangente, o líder russo ainda tenha concluído que Khodorkovsky não representa mais uma ameça política.
Sua avaliação é a de que, qualquer que seja a influência que ele exerça entre os liberais do ocidente e russos desafetos, a Rússia agora é um lugar onde valores conservadores florescem.
Para muitos russos – que justamente estão na mira de Putin para sustentar sua base de poder - Khodorkovsky continua sendo um ex-oligarca odiado, um homem que, segundo eles, construiu sua fortuna com bens roubados do Estado e do povo russo.
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